YOGA ONLINE VALE A PENA?
Julia Vaz. São Paulo, janeiro 2022.
Quando a pandemia do novo Coronavírus começou, em março de 2020, eu tinha acabado de voltar da África do Sul de férias com o Marcelo, meu marido. No aeroporto, algumas precauções já estavam sendo tomadas e nós estávamos em contato com as nossas famílias e colegas de trabalho, decidindo em conjunto o que faríamos.
No dia 16 de março de 2020 paramos com as aulas presenciais por completo e minha primeira aula em um estúdio com outras pessoas desde então foi em Lisboa, mais de um ano depois, dia 19 de junho de 2021. A única razão pela qual retomei as aulas presenciais em junho do ano passado foi o fato de estar em Portugal, onde a pandemia estava bem mais sob controle do que no Brasil, onde o aumento de casos e mortes corria em velocidade exponencial.
Em todos os estúdios de amigos e conhecidos em São Paulo, até o início de 2022, não se via no horizonte a possibilidade de voltar a receber pessoas pessoalmente nas salas de prática, então alguns poucos de nossos alunos - pois o volume de praticantes diminuiu consideravelmente - ainda se contentava em praticar olhando no celular ou na tela do computador através de plataformas de videoconferência.
Dentre as pessoas que não aderiram às aulas de yoga online, houve aqueles que não levavam fé que esse tipo de encontro poderia funcionar, aqueles que não eram muito afeitos às tecnologias e também aquelas pessoas que simplesmente preferiam os encontros ao vivo.
Aos poucos, com o avanço do vírus mundialmente e a falta de perspectiva de uma "normalização" das nossas vidas, as práticas, cursos, home office e afins foram se assentando no dia-a-dia das pessoas e ganhando um espaço que não se imaginava que poderiam ganhar. Aos poucos, fomos aceitando este estado de coisas com - correndo o risco de usar uma palavra bem gasta - resiliência e adaptabilidade.
Não posso falar por todos os professores de yoga, sei que cada um teve uma experiência única - muitos inclusive nunca aderiram às aulas online, com todo direito - mas este texto veio de uma conversa com um outro professor amigo e muito querido, com o qual compartilhei muitas dessas coisas, e que concordou com a maioria delas, inclusive me encorajando a escrever tudo isso. Posso inclusive dizer que este texto vem de várias conversas e trocas com outros professores e alunos ao longo desses dois anos dando e recebendo aulas online.
As minhas primeiras impressões das aulas online foram mistas. Eu estava passando por um momento muito peculiar da minha vida, no meio de crises com mudanças no meu corpo que vinham começando a me incomodar muito e que nem a prática e nenhum médico nem terapeuta parecia estar perto de resolver. Por este lado, eu precisava descansar, então as aulas online tiravam da minha rotina os deslocamentos longos que eu costumava fazer, tanto para assistir quanto para dar aulas, e isso parecia bom. Por outro lado, era algo completamente novo e eu não sabia muito bem como iria navegar coisas importantes que nas aulas presenciais eram muito mais simples.
Ao migrar para o online, as aulas ficaram mais baratas por gerar menos custos, e isso era mais confortável para os alunos, que também passavam pela mesma crise econômica que nós. Mas, no geral, os primeiros cortes orçamentários das pessoas comuns impactavam diretamente as práticas de yoga, consideradas não-essenciais, e por isso perdemos muitos alunos. Alguns estúdios, inclusive, foram obrigados a fechar.
Os dois estúdios onde eu trabalhava decidiram emprestar aos alunos os acessórios das salas - que não estavam mesmo sendo usados - para que os alunos pudessem praticar com mais segurança e conforto em casa. Emprestar os props também foi importante como mais um incentivo para que os alunos não desistissem de praticar por precisar investir em equipamentos.
Nos esforçávamos ao máximo para manter os poucos alunos que ainda tínhamos com o baque duplo daqueles que havíamos perdido mais a diminuição do valor das nossas aulas. E, apesar de parecer incrível, a crescente oferta de aulas, práticas e lives gratuitas de yoga pela internet afora também não nos ajudava como profissionais.
Mas, este começo, apesar de parecer desanimador, nos munia de uma força de vontade de fazer aquilo tudo funcionar, de enxergar novos caminhos e ideias dentro dessa nova realidade. De não desistir de praticar e nem de levar esse conhecimento a quem o queria receber.
Apareciam workshops e cursos intensivos com professores estrangeiros aos quais agora todos nós poderíamos ter acesso, não somente por serem transmitidos online, mas pelos valores serem mais baixos. Apareciam aulões beneficentes a causas importantes e, de certa forma, estávamos todos empenhados em amparar quem precisasse, em uma rede de ajuda mútua. Por ter exposto minhas dificuldades financeiras à minha professora na época, ela abriu uma possibilidade de desconto para que eu não parasse de praticar, e nós, como professores, fazíamos o mesmo pelos nossos alunos.
A pandemia ainda não acabou, e permanecemos receptivos àqueles que querem continuar, mas têm questões financeiras. Encontramos novas formas de reconhecer e nos relacionar com o que é essencial para nós e para o outro.
No geral, posso dizer que as aulas online foram importantes para que eu percebesse minha força e criatividade ao me ver encontrando soluções para todos os problemas que se apresentavam.
A primeira coisa que chamava nossa atenção como professores era a dificuldade em enxergar os alunos na tela e fazer ajustes. Por isso, no início, eu não dava posturas muito desafiadoras, preferindo aulas bem básicas. Depois, resolvi fazer aulas focadas em dúvidas dos alunos sobre algumas posturas mais difíceis, mas importantes, como nas invertidas.
Não ter a possibilidade de ajustar o aluno fisicamente é muito difícil, mas agora peço para que eles coloquem a câmera (ou se coloquem frente a ela) em diferentes ângulos, dependendo do que precisa ser ajustado e isso já faz uma grande diferença. Faço a mesma coisa ao demonstrar uma postura por vários ângulos diferentes para que fique clara.
É claro que essa necessidade de demonstrar todas as posturas foi algo que começou a pesar. Era algo que, em sala, eu poderia pedir que um aluno fizesse por mim. Isso tornava as aulas de 1h online às vezes mais exaustivas do que aulas de 1h30 presenciais. Daí descobri o recurso de marcar um aluno para todos os outros, e isso começou a ajudar muito quando eu estava, por exemplo, no período menstrual e não podia demonstrar certas posturas que queria dar em aula. Era só pedir que um aluno demonstrasse para a turma toda e marcá-lo, fazendo as observações e ajustes para todos ouvirem.
A conversa antes e depois das aulas também fazia falta, aquele tempinho para tirar algumas dúvidas ou conhecer melhor as pessoas. Decidi abrir esse canal de conversa pelo Whatsapp e, aos poucos, comecei novamente a trocar informações com os alunos - responder perguntas, enviar sugestões de leituras. Pedia que me enviassem vídeos da entrada e saída de posturas para as quais eles queriam orientação aos quais eu respondia com marcações, vídeos meus ou outras referências de correções e sugestões.
Enfim, a convivência com as aulas pelas telinhas começou a ficar mais naturalizada e alguns alunos decidiram permanecer nesse formato para sempre. Alguns porque se mudaram para o interior, outros porque se adaptaram muito com a prática em casa, outros porque simplesmente se surpreenderam com o quanto gostaram desse novo esquema.
Goste ou não, o virtual veio para ficar.
Na segunda semana de janeiro, voltei a dar aulas presenciais - com limite de alunos por turma e sempre de máscaras - mas as aulas são híbridas, ou seja, presenciais e transmitidas também pelo Zoom para quem preferir fazer de casa. Serão abertas turmas exclusivamente presenciais? Provavelmente. Mas não me vejo fechando as turmas online enquanto for professora. Acho que ainda temos muito pano pra manga no que diz respeito a adaptar, moldar e aperfeiçoar este formato de aula. Depois de toda essa vivência, posso dizer que estou animada pela continuidade das aulas pela telinha e tudo de novo que elas ainda têm a trazer. Talvez seja meu ascendente em aquário falando. ;)